Além da indispensável arte de imaginar um outro mundo possível, liberto de tantos dos males que hoje o assolam, precisamos imensamente da capacidade de colaborar conjuntamente em sua construção. Nisto é também imprescindível, a todos nós que arregaçamos as mangas em prol de uma realidade menos opressiva, que saibamos reconhecer, com gratidão e reconhecimento, os feitos e os méritos daqueles que no nosso passado coletivo mais fizeram, na condição de gestores do bem público, para a melhoria das condições de vida da população deste país tão brutalmente desigual e injusto.
Sem querer elevá-lo à posição de mito ou de messias, status que não cabe a nenhum ser humano de carne-e-osso, condenado à imperfeição e à perfectibilidade que é o quinhão comum da nossa humana condição, afirmo convicto que, após estudar sua biografia, analisar seus atos e discursos, sopesar sua trajetória entre os vivos, concluo que Luiz Inácio Lula da Silva mereceria ser considerado um dos maiores benfeitores em relação aos tradicionalmente excluídos e desvalidos que já esteve em uma posição de poder neste Brasil de males infindos.
Ele, que merece que a ele manifestemos nosso respeito, que merece nossa admiração e nossa disposição para o aprendizado, que merece ser nosso companheiro e amigo na luta conjunta para avançarmos juntos enquanto civilização, hoje está preso injustamente e é tratado como bandido, achincalhado como traíra, apedrejado como corrupto, agredido por xingamentos e memes estúpidos que são propagados e divulgados por pessoas que, não tenho dúvida, nunca fizeram pelo país nem 5% do que ele fez em matéria de políticas públicas que beneficiam a população real e concreta que pena neste país.
Já estaríamos um pouco melhor em matéria de civilidade se essas pessoas que vociferam sua raiva contra Lula e o lulismo pudessem se perguntar com sinceridade, num exercício auto-reflexivo e de auto-descoberta: o que foi que eu já fiz de real e concreto em prol da melhoria da vida do povo do Brasil? O que Lula fez foi uma imensidão, e é imensa a tristeza ao perceber o quanto alguns, cegos por um ódio inoculado pelas elites, são incapazes do mínimo reconhecimento de suas múltiplas qualidades.
Uma das mais tristes manifestações da nossa tragédia sócio-política atual é a falta de lucidez e serenidade no trato com o legado real do lulismo no poder: não seria melhor sopesar seus benefícios, avaliar a extensão de seus acertos, fazer a justa dose de crítica a seus limites e equívocos, colaborar para que o petismo pudesse ir além de seus passos em falso e de suas coligações espúrias? Sem dúvida, a crítica construtiva seria salutar e bem-vinda.
Mas nos grupos de Whatsapp, nas imprensas da pós-verdade, nos templos de bilionários pastores, há fanatizadas seitas de Bolsominions onde o que reina é a boçalidade desumana: recebi nestas eleições alguns tristes memes que falam de petistas como ratos a serem exterminados. O que evoca a triste lembrança do III Reich alemão, que também justificou o Holocausto com ideologia semelhante: a exterminação das pragas que eram as raças não-arianas.
As pessoas tem pleno direito à discórdia e à crítica em relação aos cerca de 5.000 dias em que o PT esteve no comando do Executivo Federal. A liberdade de expressão e de manifestação do pensamento é um baluarte de qualquer ordem democrática civilizada, mas não é verdade que ela seja sem limites: não há o direito legalmente reconhecido a mentir, ofender, caluniar, difamar, reduzir o outro ao status de subcidadão ou subhumano.
O que alguns seguidores de Bolsonaro realizam com a figura de Lula não é exercício da liberdade de expressão – é mentira socialmente organizada com fins sádicos e cruéis. É comportamento de gangue devotada ao gozo com o sofrimento dos outros. O Bolsonarismo, além de nos ameaçar com uma nova ditadura, com choque neoliberal e altos privilégios para o patronato, apropria-se do que pior já se inventou em matéria de demagogia: ele une Goebbels aos marketeiros que ajudaram a eleger Trump nos EUA, puxando o nível do jogo democrático para um grau de baixeza, de torpeza e de desrespeito que não tem similares no Brasil do século 21.
Obviamente uma crítica construtiva que é escutada serve como excelente trampolim para a melhoria das práticas políticas – e o campo do petismo deveria sim reconsiderar certos caminhos, do ecocídio à la Belo Monte ao seu apego à conciliação de classes que André Singer bem descreveu como “reformismo gradual e pacto conservador”. Mas o que ocorre atualmente está muito longe de ser uma avalanche de críticas justas ao PT, na verdade estamos vendo a massificação de um discurso falsificador, violento e vil. É uma fusão do antipetismo com o fascismo: ao invés de argumentos, estatísticas ou estudos, as pessoas tacam pedras, facadas e tiros sobre os petistas, perpetrando ofensas e agressões que só revelam a irracionalidade de um ódio inculcado, por anos, por nossos podres poderes elitistas, a começar pelo empresarial-midiático.
Em Outubro de 2018, caso o Estado Democrático de Direito não tivesse sofrido toda uma série de atentados durante os últimos 4 anos, poderíamos estar celebrando a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva. Ele receberia a faixa presidencial de Dilma Rousseff e seria reconduzido ao poder pela única via legítima em uma democracia representativa: a soberania popular que se manifesta em um processo de sufrágio universal legítimo e equânime.
Hoje, isso já se tornou uma fantasia, uma imaginação de um passado alternativo, e nossa realidade histórica é bem outra: com a ascensão da extrema-direita, uma das figuras históricas mais importantes em toda a trajetória dos povos latino-americanos no mundo contemporâneo foi tratado de modo cruel e profundamente injusto. Talvez não aja hoje, globo afora, um preso político que seja tão caluniado, ofendido e maltratado quanto Lula, que há 6 meses padece na masmorra da Polícia Federal em Curitiba devido a um processo kafkiano, que não se sustenta em pé, denunciado como fraudulento por dúzias de renomados juristas, resultado do processo de perseguição política-partidária instituída por setores da Lava Jato chefiados por Moro.
Triste do povo que não sabe reverenciar seus benfeitores e que se faz de marionete dos tiranos que só querem propagar malefícios em prol de privilégios para uma minúscula elite. Imaginar um Brasil governado pelo Bozonazismo é um verdadeiro pesadelo acordado, distopia do real: neste país, Lula vai apodrecer na prisão, morrendo atrás das grades, enquanto a tirania militar-policial defende um sistema de exclusão baseado na grosseria bárbara da dominação masculina, heteronormativa e homofóbica, racista e supremacista, armamentista e anti-dialógica, que expulsa os cidadãos da participação efetiva nos assuntos públicos, recolocando no domínio os milicos, os banqueiros, os capitalistas bélicos, os massacradores da diversidade.
É contra isso que agora precisamos nos levantar numa grande frente unida, pela democracia tão combalida. E não há dúvida que a Coligação Povo Feliz de Novo, liderada por Fernando Haddad e Manuela D’Ávila, tem um projeto de governo e um sonho de país que representa os anseios de liberdade, justiça social, participação cívica, educação e saúde públicas, que nosso povo deseja e merece. Vamos juntos, sem medo das tempestades que se avizinham, numa aventura incansável para construir este “inédito viável”, de que fala Paulo Freire, que é uma sociedade solidária e fraternal. Como disse o Lula: “Não adianta tentar parar o meu sonho, porque quando eu parar de sonhar eu sonharei pela cabeça de vocês.” E já somos milhões de Lulas, e hoje Lula é Haddad para dezenas de milhões de brasileiros que não querem o triunfo da estupidez, do ódio, da mentira e da desumanidade.
Seguimos juntos, relembrando os ausentes que foram tombados pela brutalidade vigente (#MariellePresente), sempre apegados à sabedoria Ubuntu: eu sou porque nós somos. Se fere nossa existência, seremos resistência.
A Casa de Vidro – www.acasadevidro.com
#LulaLivre #HaddadPresidente #ManuNoJaburu #PovoFelizDeNovo#EleNão #EleNunca #EleJamais
LEIA TAMBÉM:
* * * * *
PARTE 2 – O PACTO COM OS DERROTADOS PARA UM TRIUNFO PORVIR DA JUSTIÇA POSSÍVEL
Quase 50 milhões de brasileiros – majoritariamente nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste – demonstraram nas urnas, neste 1º turno das Eleições, seu apoio a um projeto político de extrema-direita e deram seu aval para o governo de um dos sujeitos mais execráveis, despreparados e perigosos que já se aventurou a pleitear o cargo supremo do Executivo Federal.
A tristeza é imensa ao pensar no quanto isto é sintoma da falência múltipla de órgãos de nosso combalido Estado Democrático de Direito. Esta tendência já havia se manifestado com o golpeachment que depôs Dilma Rousseff em 2016 e com a fraude judicial que encarcerou Lula em 2018 com o objetivo de impedi-lo de vencer a Eleição para a qual era franco favorito. Agora, escancara-se que o ovo da serpente, chocado pelos golpistas, deu como “filhote” o Fascismo evangélico-patronal-massmidiático que hoje está disseminado pelo corpo social, espalhando o câncer do ódio e da segregação, da boçalidade e do sadismo.
Neste 1º turno, pudemos perceber o “gigantismo” das tendências machistas, racistas, supremacistas, armamentistas, xenófobas, que infelizmente ainda animam um tão grande número de nossos concidadãos. É lamentável notar também a magnitude da alienação religiosa que turva a lucidez e impede a clarividência de milhões de brasileiros: eles se dizem cristãos e, traindo a mensagem de Jesus de Nazaré (que foi torturado até a morte!), resolvem dar seu apoio a um homem como Bolsonaro, que trata os torturadores da Ditaduras, como Ustra, como se fossem heróis e não criminosos. Os crimes contra a Humanidade praticados por Ustras e Pinochets são celebrados por Bozo, que parece aspirar a cometê-los também, uma gravíssima ameaça que merece atenção de entidades de defesa dos Direitos Humanos globo afora, como a Anistia Internacional Brasil e asNações Unidas (desrespeitadas no processo eleitoral de 2018).
O fanatismo religioso e os valores neopentecostais também tem muita culpa nesta tragédia: como podem as multidões evangélicas serem assim tão cegas e alienadas a ponto de não perceberem que Bozo é um falso profeta e a encarnação diabólica de tudo o que está no extremo oposto do “amai-vos uns aos outros”?
Triste estupidez do Elitismo no Brasil, que consegue arrebanhar tantos súditos para seu projeto desumano, inclusive realizando a proeza de conquistar, para a sua ideologia, fatias significativas dos pobres (as esfinges sociológicas, difíceis de decifrar, que são os “pobres de Direita”, aqueles que votam de maneira totalmente contrária a seus próprios interesses, como no caso de mulheres negras e periféricas que votam num Bozo que as abomina e promete colaborar com o incremento de seu genocídio).
A campanha de Bozo e seus Bozominions, repleta de crimes eleitorais e deslealdades, que abusou das fake news e da boataria difamatória, que usou o “voto de cabresto” empresarial à torto e a direito, que fez chantagens horrorosas com o eleitorado brasileiro (inclusive a ameaça que fez Bozo de não aceitar o resultado das urnas caso seja derrotado), foi a explicitação do quanto o “fair play” democrático degradou-se gravemente entre nós.
Tudo isso demonstra não a Vitória do projeto melhor para o Brasil e seu povo, mas o triunfo relinchante da estupidez, da covardia, da barbárie empoderada, que nos encaminha para a possibilidade de guerra civil e de um genocídio de limpeza étnica. Pois Bozo e seus escudeiros são o mais perto de um regime nazi-fascista que já chegou tão próximo ao poder estatal desde o fim da Ditadura Militar.
Uma visão-de-mundo sádica, toda calcada no ódio às minorias, no racismo mais baixo, no machismo mais tosco, no desrespeito mais flagrante às vidas que escolhem modos de amar diversos dos ortodoxos, sai “consagrada” pela maioria dos eleitores em nossas tristes urnas em 07 de Outubro de 2018.
E ainda há hordas de idiotas que acham que este resultado é algo a celebrar, quando é evidente e explícito para qualquer ser lúcido e sensível que no dia de hoje todo o Brasil perdeu e fracassou. Revelou-se a extensão e o grande número dos “patriotários” e “suicidadãos”, como disse o poeta José Paulo Paes, que entre nós medram.
A civilização, entre nós, demonstrou suas imensas fraturas expostas nesta onda de votos na barbárie fascista encarnada por Bozonazi e Mourão.
A sensação é de que ninguém venceu, muito menos esses que agora comemoram, urrando em glória e disparando fogos de artifício, como se não fossem depois ser esmagados pelos trogloditas. Quem hoje comemora é pois acha que os trogloditas só vão esmagar os “outros”, os “vagabundos”, os “petralhas”, os “comunistas”, as “feministas”, o “negrada”, todos aqueles que parte deste eleitorado desejaria ver “fuzilado”, como pregou o “Messias” da violência cujas botas eles hoje lambem.
Todos nós perdemos com a ascensão dessa extrema-direita niilista que hoje nos ameaça com uma hecatombe humitária. Elegendo Bozo no segundo turno, praticaremos suicídio coletivo. Perderemos a capacidade de construir juntos uma sociedade justa, solidária e fraternal. Perderemos a chance de investir numa democracia do diálogo e da diversidade múltipla em convivência fecunda.
Neste primeiro turno, a maioria dentre nós escolheu a via da segregação, da fúria contra a diversidade, do supremacismo do Macho Militar, aquele que pretende botar “ordem” no recinto com o preceito mais estúpido: resolver tudo no tiro.
É um dia triste no Brasil, mas também um dia que revelou toda a grandeza maravilhosa e de valor inestimável do povo do Nordeste. Sem querer alimentar separatismos que teriam trágicas consequências, é inegável que, no Brasil atual, os Estados nordestinos estão na vanguarda da defesa da nossa Democracia que sangra com esta grave hemorragia. O Nordeste mostrou-se o bastião de defesa da Democracia e o sinal mais pujante de que a melhoria concreta nas condições de vida da população que ali vivia, durante os 5.000 dias de lulismo no poder, não foi esquecida – nem será tão cedo.
Seguimos na luta, sem resignação nem falsas esperanças, no combate de toda uma vida, que transcende as urnas, na companhia dos valorosos Fernando Haddad, Manuela D’Ávila, Luiz Inácio Lula da Silva, Ciro Gomes, Guilherme Boulos, Dilma Rousseff, dentre tantos outros políticos-guerreiros que seguem batalhando sem descanso pela democratização, pela justiça, pela fraternização possível dos brasileiros em uma pátria mais solidária e menos odienta.
Que não baixemos nossas cabeças diante daqueles que falsamente se decretam “Vencedores” quando não passam dos cúmplices da Derrota mais vergonhosa que pode acometer uma coletividade humana: o colapso de sua solidariedade, ao cair de joelhos diante do autoritarismo acéfalo e brucutu que o Bozonazismo entre nós “representa”. Espelho do que há de pior no Brasil, o triunfo atual do Bozonazismo coloca também um imenso desafio para o futuro da Educação no Brasil. Hoje, mais que nunca, precisamos lembrar do alerta de ADORNO, Theodor – a potência da dialética: a tarefa pedagógica mais urgente é educar para a consciência crítica, a reflexão autônoma, o exercício concreto da cidadania e da participação social, para que Auschwitz nunca se repita. Tarefa para gerações, e que realizaremos com a ameaça tenebrosa das Auschwitz tropicais que o Bozonazismo promete instaurar entre nós – se formos estúpidos o bastante para permitirmos esse suicídio coletivo.
Sigo, convicto, apoiando Haddad, o melhor Ministro da Educação que este país já teve, que propõe livros e não tiros, trampos e não tanques, cultura e não besteirol sádico, fraternidade e não fuzilamento, civilização e não barbárie. Haddad é Lula, Lula é Dilma, Dilma é Boulos, e somos milhões. E, se perdemos nas urnas, nos veremos nas ruas, nas redes, nas ocupas, nas acampas, nas marchas, nos protestos, nas guerrilhas, nos raps, nos filmes, nos clipes. Resistiremos.
Pois quem não respeita nossa existência há de sofrer resistência. A urgência nos fará transcender nossas diferenças em uma grande frente unida contra o fascismo. Só o tempo dirá se ela será suficiente para evitar o pior.
De todo modo, lembrando Darcy Ribeiro, em momentos como esses, mais do que nunca, sentimos que estamos certos ao estar do lado dos derrotados, dos humilhados, dos ofendidos, dos oprimidos em seu processo de partejar uma realidade menos opressora e menos injusta.
Eu odiaria ser o tipo de pessoa que celebra esse Horror que é a votação de Bolsonaro, uma celebração que atesta a baixeza de caráter e a irreflexão ética típicas de indivíduos fabricados em massa naquelas sociedades que, como ensinou Hannah Arendt, afundam-se no abismo dos “massacres administrativos” e da “banalidade do mal”.
Tempos muito sombrios se avizinham. E a esperança, equilibrista, ainda tenta atravessar o fio sobre esse abismo.
Acompanhe A Casa de Vidro –www.acasadevidro.com
Publicado em: 08/10/18
De autoria: casadevidro247
A Casa de Vidro Ponto de Cultura e Centro de Mídia